sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

Doxologia final da Oração Eucarística: elevação da patena com a hóstia e do cálice

Entre as partes que competem ao sacerdote ocupa o primeiro lugar a Oração Eucarística, ápice de toda celebração. (IGMR, n. 30)


Muitas palavras de origem grega ou latina fazem parte do vocabulário da liturgia da Igreja Católica Romana. Algumas reclamam, ainda que rapidamente, uma explicação. E uma delas é doxologia.

Doxologia (do grego: doxa = glória + logos = palavra) quer dizer, em linguagem litúrgica, a oração de louvor dirigida a Deus.

A Oração Eucarística, que ocupa substancialmente a segunda parte da Missa (IGMR, n. 28), termina com a fórmula de louvor a Deus, de solene glorificação tributada à divina Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo), chamada tecnicamente de doxologia final, como, por exemplo, na Oração Eucarística I, ou Cânon Romano:

Por Cristo,
com Cristo, 
em Cristo,
a vós, Deus Pai todo-poderoso,
na unidade do Espírito Santo,
toda a honra e toda a glória, 
agora e para sempre.

E o povo (assembleia) aclama:

Amém.

Ou, mais precisamente como diz a Instrução Geral do Missal Romano - IGMR (3ª edição típica), traduzida e editada pela CNBB:

A doxologia final que exprime a glorificação de Deus, e é confirmada e concluída pela aclamação Amém do povo. (n. 79, h)

A Missa não está, pois, terminada. Terminada (e ratificada) está a Oração Eucarística.

A Oração Eucarística deve ser dita, proferida, em voz alta e distinta (IGMR, n. 32) e a sua dicção (proferição) compete somente ao sacerdote ministerial. Nesse sentido, é a regra da mencionada Instrução Geral do Missal Romano - IGMR (3ª edição típica), traduzida pela CNBB:

A Oração Eucarística, por sua natureza, exige que somente o sacerdote, em virtude de sua ordenação, a profira. (n. 147)
A doxologia final da Oração Eucarística é proferida somente pelo sacerdote celebrante principal e, se preferir, junto com os demais concelebrantes, não, porém, pelos fiéis. (n. 236)

A elevação da patena com a hóstia e do cálice, na doxologia conclusiva da Oração Eucarística, também, e pela mesma razão que ordena a proferição (dicção), pertence ao sacerdote fazê-la, como dispõe a mesma e citada IGMR:

Após a consagração, tendo o sacerdote dito: Eis o mistério da fé, o povo profere a aclamação, usando uma das fórmulas prescritas. 
No fim da Oração eucarística, o sacerdote, tomando a patena com a hóstia e o cálice ou elevando ambos juntos profere sozinho a doxologia: Por Cristo. Ao término, o povo aclama: Amém. Em seguida, o sacerdote depõe a patena e o cálice sobre o corporal.(n. 151)

A Instrução Geral do Missal Romano (2002) traduzido para Portugal espelha melhor o objetivo da regra litúrgica ao não usar a conjunção ou (que, no texto do Brasil, afigura-se indicar alternativa ou opcionalidade). E mais: a tradução para o português de Portugal está, nesse aspecto, na linha das traduções espanhola e francesa, como segue:

A seguir à consagração, depois de o sacerdote dizer: Mistério da fé (Mystérium fidei), o povo aclama, utilizando uma das fórmulas prescritas. 
No fim da Oração eucarística, o sacerdote toma a patena com a hóstia e o cálice e, elevando-os ambos, diz sozinho a doxologia: Por Cristo (Per ipsum). No fim o povo aclama: Amen. A seguir o sacerdote depõe a patena e o cálice sobre o corporal. (n. 151) [http://www.presbiteros.org.br/instrucao-geral-do-missal-romano-2002-portugues/]

A elevação de ambos (patena e cálice) pelo sacerdote sucede na Missa sem diácono (IGMR, nn. 120-170); na Missa com diácono (IGMR, nn. 171-186), a este compete a elevação do cálice.

Justino (martirizado por volta do ano 165) transmite-nos seguras informações sobre a celebração da Eucaristia, na parte que diz respeito ao nosso assunto:

Quando o presidente termina as orações e a acção de graças, todo o povo presente aclama, dizendo: Amen. Amen, na língua hebraica, quer dizer assim seja. (Apologia I, 65,3-4,  Antologia Litúrgica, Secretariado Nacional de Liturgia, Fátima, p. 140)

Santo Inácio de Antioquia, citado no Catecismo da Igreja Católica (n. 1369), confirma:

«Seja tida como legítima somente aquela Eucaristia que é presidida pelo bispo ou por quem ele encarregou» 

No plano do direito eclesiástico (Código de Direito Canônico - 1983), não é diferente:

Cân. 900 — § l. O ministro que, actuando na pessoa de Cristo, tem o poder de celebrar o sacramento da Eucaristia, é somente o sacerdote validamente ordenado.

A competência exclusiva do ministro ordenado (presbítero e bispo) é realçada e revalidada pelo mesmo Código de Direito Canônico (1983):

Cân. 907 — Na celebração eucarística não é permitido aos diáconos nem aos leigos proferir as orações, em especial a oração eucarística, ou desempenhar as funções que são próprias do sacerdote celebrante.

O diácono é ministro do cálice (IGMR, nn. 94, 171, b, e 180). Assim, na Missa em que haja diácono a ministrar, a este compete fazer o gesto da elevação do cálice, conforme enunciado:

À doxologia final da Oração Eucarística, de pé ao lado do sacerdote, o diácono eleva o cálice, enquanto o sacerdote eleva a patena com a hóstia, até que o povo tenha aclamado: Amém. (IGMR, n. 180)

O Cerimonial dos Bispos também contempla:

À doxologia final da Oração eucarística o diácono, pondo-se ao lado do Bispo, eleva o cálice, enquanto o Bispo eleva a patena com a hóstia, até que o povo tenha dito a aclamação Amém. A doxologia final da Oração eucarística é proferida pelo Bispo sozinho ou por todos os concelebrantes juntamente com o Bispo. (n. 158)

Giuseppe Carlo Cassaro, formador de estudantes de Teologia que se preparam para o sacerdócio, esclarece nesse aspecto o ofício do diácono:

À doxologia final da oração eucarística, o diácono, estando à direita do presidente, mantém elevado o cálice na mão direita, ficando a esquerda sobre o peito. Convém que o cálice seja elevado à mesma altura a que se encontra a patena elevada pelo presidente e permaneça nessa posição até o povo proclamar "Amém". (Guia Prático para a Liturgia, 1ª edição - novembro de 2014, Lucena, Cascais, Portugal, p. 38, nº 57)

Por conseguinte, em não se cuidando de Missa concelebrada ou em não se tratando de Missa celebrada com diácono, compete unicamente ao sacerdote (presbítero, comumente chamado padre, ou até mesmo bispo) que preside a celebração não só dizer a doxologia final mas também fazer a elevação da patena com a hóstia e do cálice, como bem ilustra a imagem acima reproduzida e que retrata a regular situação celebrativa das paróquias e capelas (Missas sem diácono).

Em reforço do que já narrado, a doxologia final, composta de palavras e gestos, é parte constituinte da oração eucarística. Assim, se expressa Cesare Giraudo:

Trata-se do nono elemento estrutural da oração eucarística, que a liturgia cristã herdou da oração veterotestamentária e judaica. Para compreender-lhe  a função, recordemos que, passo a passo com a sucessão de intercessões, aumenta a tensão para o Reino escatológico no qual pedimos a Deus que nos introduza, no desejo de glorificá-lo sem fim. A doxologia se configura como inclusão laudativa, como retorno ao tema do louvor inicial, começado no prefácio. A este  louvor solene, que anima toda a oração eucarística, a assembleia responde com um Amém igualmente solene. (Redescobrindo a Eucaristia, 3ª edição - maio de 2005, Edições Loyola, são Paulo, p. 67).

Segundo José Aldazábal (A Eucaristia, em A Celebraçao na Igreja, vol. 2, Edições Loyola, 1993, p. 343) e muito mais conforme a Instrução Geral do Missal Romano (nn. 30 e 78), a oração ou prece eucarística é uma oração presidencial.

Por derradeiro, a regra geral, o ordinário das coisas, é que as "orações presidenciais" sejam proferidas pelo sacerdote ministerial que, presidindo a comunidade como representante de Cristo, dirige a Deus tais  orações  em nome de todo o povo santo e todos os presentes (cf. IGMR, n. 30). Qualquer coisa nova que se queira (uma exceção a normas gerais) exige norma litúrgica ou canônica expressa, específica, editada por autoridade eclesiástica hierárquica e competente.

De outra banda, não tem sentido litúrgico o povo presente (assembleia) fazer gestos, como estender as mãos em direção ao altar nesse momento da elevação do cálice e da patena com a hóstia, uma vez que, como já se disse, a Oração Eucarística é uma oração presidencial, isto é, oração que compete exclusivamente ao sacerdote que preside a celebração da Missa (Eucaristia) dizê-la. E, no particular, a doxologia final, com palavras e gestos, faz parte integrante da Oração Eucarística. Logo, não há, nesta fase celebrativa, lugar para uma participação gesticular por parte da assembleia.

Por último, concluímos que as normas litúrgicas e também as canônicas da Igreja Católica Romana não autorizam o leigo e nem mesmo o leitor instituído (IGMR, nn. 99, 194-198) ou o ministro extraordinário da sagrada comunhão a fazerem a elevação do cálice quando se profere a fórmula da doxologia final. E muito menos a elevação da patena com a hóstia.


Leia mais:

As Doxologias na Liturgia, por Frei Alberto Beckhäuser, OFM

Alguns esclarecimentos sobre o papel dos diáconos na liturgia, por pe. Edward McNamara, LC

A Oração do Senhor: "Pai Nosso" (Catecismo da Igreja Católica)


Fonte da imagem:
https://linguagemdoceu.com/blog/conheca-os-gestos-e-posturas-que-o-ajudarao-viver-melhor-missa/

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